quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Impaciência

A menina estava absorta na leitura de um livro qualquer. E a criada, mais que incomodada, não conseguia esconder em seus gestos impacientes uma indignação quase revoltada. Em um dado momento, estalou a vassoura no chão com um som seco, quebrando o silêncio e a barreira entre as duas.
- Mas vai brincar menina! Tanta boniteza lá fora e a mocinha fica aí, perdendo tempo com essas coisa!
Sem desviar o olhar das palavras, a menina sorriu inerte e respondeu:
- Mas é que tem boniteza aqui também.
- Ah, mas que é besteira! Que não fala como se eu não entendesse das coisa não que eu sei ler desde criança. Só nunca gostei disso não, gosto de ver as coisa eu mesma.
Ainda sem desviar o olhar de sua leitura, lacônica, ela retrucou:
- Pois então veja o mundo e me deixe ler.
- Pois eu não tenho é tempo pra isso não. Tenho que limpar o chão, varrer o quarto, limpar banheiro e cozinhar. Por isso que não gosto disso de você aí! Se eu pudesse eu vivia, não ficava trancafiada!
Pela primeira vez interessada, deu-se ao trabalho de olhar de verdade aquela figura que lhe dirigia a palavra. Usava um vestido curto, desbotado, de bolinhas já tão amareladas que era impossível dizer sua cor natural. Um pano na cabeça amarrado de forma qualquer, prática. Em uma mão, a vassoura, Na outra, um recipiente qualquer, possivelmente com um líquido de limpeza. A criatura parecia-lhe a personificação de algo maior, como que uma entidade representativa se manifestando, dialogando sobre seus princípios.
A menina de súbito se levantou, deixando a criada mais perplexa que satisfeita consigo mesma, que não era nunca ouvida pela gente da casa.
- Ah, vai me ouvir então! Menina assim é tudo igual, se finge de que gosta de livro mas só quer flor e amor!
- Resolvi ler lá fora, onde é mais quieto.

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